A PERSPECTIVA DE PAULO
I – Introdução
A vida de Paulo é uma riqueza sem fim. Para qualquer aspecto
do ministério dele, que focalizarmos nosso olhar, não faltará material de
pesquisa, seja para estudá-lo como teólogo, escritor, pastor e mestre, ou
missionário. Embora, para este último caso, não exista ainda um bom acervo da
missiologia de Paulo, sobretudo em língua portuguesa. É lamentável, porque
Paulo, o missionário é, com certeza, uma das facetas mais importantes do
apóstolo.
Não encontrei, em português, um livro sequer com o título de
Paulo, o missionário. Em inglês existe apenas (até onde temos conhecimento) o
livro Paul the missionary, de William M. Taylor, publicado pela Harper &
Brothers Publishers em 1902. É verdade que existem livros e artigos, tanto em
português quanto em inglês (alguns deles são citados neste ensaio
bíblico-teológico), que tratam da obra missionária de Paulo como um todo,
porém, somente o livro de Taylor traz em sua capa um título específico.
Neste meu estudo veremos como a teologia de Paulo subsidiava
a sua missão, qual a natureza dessa teologia, como era feita, qual a influência
de sua missiologia sobre ela e como o apóstolo entendia a dinâmica de sua
missão no contexto de seu ministério apostólico. Além disso, quais eram as
verdadeiras motivações missionárias dele? Eram tão somente teológicas,
apocalípticas e escatológicas ou envolviam mais alguma coisa? E quanto à
estratégia de trabalho, o apóstolo possuía alguma? Qual? Enfim, qual era a
perspectiva missionária de Paulo?
A estas e outras perguntas tentaremos responder no decorrer
deste estudo.
II – Estudo Gramatical
A palavra "missionário" não aparece na Bíblia. O
termo equivalente no Novo Testamento é "apóstolo". Entretanto, não
existe unanimidade entre os estudiosos quanto ao uso de apóstolos como sinônimo
para "missionário". Everett Harrison (In EHTIC, 1988, p. 104), por
exemplo, observa que não há justificativa para fazer de "apóstolo" o
equivalente de missionário. Johannes Blaw (A Natureza Missionária da Igreja,
1966, pp. 77,8), por sua vez, reconhece que originalmente os termos
"apóstolo" e "missionário" não eram sinônimos, mas depois
houve uma mudança. Diz ele:
Antes de mais nada deve ficar entendido que a palavra
"apóstolo", na sua origem e significação, não é sinônima de
"missionário", no sentido comumente atribuído a este último termo.
(...). Só depois da ressurreição (de Cristo) o título "apóstolo" toma
a conotação especial de "missionário", de enviado às partes extremas
da terra.
Concordamos com Blaw e, principalmente, com Timóteo Carriker
(Missões na Bíblia, 1992, p. 120), por afirmar: O termo missionário vem do
latim, que, por sua vez, traduz a palavra grega apostolos, a qual significa o
enviado (1).
2.1 O significado amplo de apóstolos
a. No grego clássico
No grego clássico, o substantivo apóstolos aparece pela
primeira vez na linguagem marítima, significando um navio de carga ou a frota
enviada. Mais tarde passou a designar o comandante de uma expedição naval e
também um grupo de colonizadores enviados para além-mar. Nos papiros podia
designar uma fatura, ou mesmo um passaporte. Somente em duas passagens em
Heródoto é que apóstolos significa um enviado ou emissário como pessoa
individual. Os termos comuns são aggelos (mensageiro) ou keryx (arauto). O
historiador Flávio Josefo usou apóstolos ao tratar de um grupo de judeus
enviados para Roma (Ant. In NDTNT, p. 234).
Todos os empregos de apóstolos no grego clássico têm duas
idéias em comum. 1) Uma comissão expressa e 2) Ser enviado para além-mar.
Assim, conforme lembram Eicken e Lindner, o sentido da raiz, no caso do
substantivo, é estreitado na sua definição (In DITNT, 1984, p. 234).
Acredita-se (2) que foi somente mais tarde, nos círculos
gnósticos, que o termo apóstolos passou a transmitir o conceito oriental de
emissários como mediadores da revelação de Deus. No gnosticismo o termo em
questão podia ser empregado no singular (apóstolos) para se referir a um
salvador celestial, ou no plural (apostoloi), para representar certo número de
pessoas "salvadoras" ou "espirituais" (EICKEN &
LINDNER, In DITNT, 1984, pp. 234,5).
b. Na LXX
Na Septuaginta (LXX), a versão grega do Antigo Testamento
hebraico, o termo "apóstolo" não era usado no sentido técnico de
designar alguém para um ofício "missiológico", mas sim, uma nomeação
para se cumprir qualquer função ou tarefa que normalmente se definia com
clareza. Isto explica, de certa forma, porque o verbo apostélloo e não o
substantivo apóstolos é empregado quase que exclusivamente no AT. O verbo
apostélloo não se encontra no Antigo Testamento no sentido de "ser enviado"
para fazer missões, conforme aparece no Novo Testamento.
O judaísmo não conhece missões no sentido de oficialmente
enviar missionários (Eicken e Lindner, In DITNT, 1984, p. 235). Isto não quer
dizer que a Bíblia deixe de reconhecer a idéia de missões no Antigo Testamento.
O que ocorre é que existe entre o AT e o NT, no que concerne à obra
missionária, uma diferença de grau e ênfase, mas não de essência ou natureza da
missão (3).
c. No Novo Testamento
Ao contrário da LXX, no Novo Testamento o substantivo
apóstolos recebe uma ênfase toda especial. Aparece 6 vezes em Lucas, 28 em
Atos, 34 em Paulo, uma vez em Hebreus, 3 vezes em Pedro, uma vez em Judas, 3
vezes em Apocalipse. Mateus, Marcos e João empregam a palavra uma vez cada em
seus respectivos evangelhos. No NT, um apóstolo (no sentido técnico como o
termo era usado, isto é, um enviado de Deus para anunciar as boas novas de
salvação) era alguém que não só tinha visto o Senhor ressuscitado, mas que
devia ser capaz de afirmar, fundamentando a sua afirmação, que havia sido
chamado e designado de modo especial, diretamente pelo próprio Senhor, para ser
apóstolo.
2.2. O significado restrito (4) de apóstolos
a. "apóstolos" em Paulo
Para Paulo, a vocação e comissão para o apostolado não eram
através dos homens, "mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai" (Gl 1.1
cf. Rm 1.5; 1
Co 1.1; 2 Co 1.1). Tal comissão veio através de um encontro
com o Senhor ressurreto (1 Co 15.7; Cl 1.16), que pessoalmente entregou a ele a
mensagem do evangelho (1 Co 11.23; 2 Co 4.6; Gl 1.12). O apóstolo pregou o
evangelho a homens e mulheres como "embaixador" de Cristo (2 Co
5.20), não por capacidade inata do seu ser (2 Co 3.5), mas pela livre graça de
Deus (1 Co 15.9,10; Ef 3.8).
Não fica claro em Paulo a quem ele considerava apóstolo. É
evidente que ele se incluía no número deles, conforme afirma catorze vezes em
suas epístolas. Pertenciam também ao grupo de apóstolos, na opinião de Paulo,
Pedro (Gl 1.18,19), Júnias, Andrônico (Rm 16.7) e Barnabé (Gl 2.1,9,13). Alguns
estudiosos, como D. Muller (In DITNT, 1984, p. 237), questionam se Paulo
considerava Tiago, irmão do Senhor, como sendo apóstolo, argumentando que a
expressão ei me ("senão") de Gálatas 1.19 é ambígua. Entretanto,
Harrison (In EHTIC, 1988, p. 104) esclarece que
A explicação mais natural de Gl 1.19 é que Paulo está
esclarecendo que Tiago, o irmão do Senhor, é um apóstolo, de conformidade com o
reconhecimento que recebia da igreja de Jerusalém. Em harmonia com isto, em I
Co 15.5-8, onde Tiago é mencionado, todos os demais são apóstolos.
Curiosamente Paulo nunca aplica o título de apóstolo aos
Doze como grupo específico. Segundo D. Muller (In DITNT, 1994, p. 237),
não podemos ter certeza de que as características que Paulo
atribuía aos apóstolos são necessariamente aplicáveis ao apóstolo do NT
propriamente dito, ou se Paulo considerava que os Doze fossem apóstolos, e qual
era o número dos apóstolos nos dias de Paulo.
É evidente que no conceito amplo que Paulo tinha do termo
apóstolo, os Doze certamente estavam incluídos. Pelo menos em duas epístolas
suas Paulo lança luz sobre esta questão. Em 1 Coríntios 15.5,7 ele diz: E
apareceu a Cefas, e, depois, aos doze. Depois foi visto por Tiago, mais tarde
por todos os apóstolos (grifo nosso). E em Gálatas 1.18,19: Decorridos três
anos, então subi a Jerusalém para avistar-me com Cefas, e permaneci com ele
quinze dias; e não vi outro dos apóstolos, senão a Tiago, o irmão do Senhor
(grifo nosso).
b. Paulo como apóstolo
Os aspectos distintos do apostolado de Paulo foram a
nomeação direta dele por Cristo (GI 1.1) e a designação feita a ele do mundo
gentio como sua esfera de trabalho (At 26.17,18; Rm 1.5; Gl 1.16; 2.8). Seu
apostolado foi reconhecido pelas autoridades em Jerusalém, de conformidade com
sua própria reivindicação no sentido de ser classificado em pé de igualdade com
os primeiros apóstolos. Apesar disso, nunca afirmou ser membro do grupo dos
Doze (1 Co 15. 11), pelo contrário, mantinha-se independente. Era capacitado
para dar testemunho da ressurreição porque a sua chamada viera do Cristo
ressurreto (At 26.16-18; 1 Co 9.1).
Paulo considerava seu apostolado uma demonstração da graça
divina, bem como uma chamada à labuta sacrificial, ao invés de uma oportunidade
para se vangloriar (1 Co 15.10). Não dava nenhuma sugestão de que a posição
especial de apóstolo o exaltasse acima da Igreja e que o distinguisse dos
demais que tinham dons espirituais (Rm 1.11, 12; 1 Co 12.25-28; Ef 4.11). Sua
autoridade não se derivava de alguma qualidade especial nele (1 Co 3.5), mas do
próprio evangelho, na sua verdade e no seu poder para convencer (Rm 1.16;
15.18; 2 Co 4.2). Além disso, o chamado e missão de Paulo estavam tão ligados à
sua vida, a ponto do apóstolo designar o evangelho de "meu evangelho"
(Rm 2.16; 16.25; 2 Tm 2.8). Mas mesmo assim, procurava deixar claro quando
estava dando a sua própria opinião (Cf. 1 Co 7.10-12).
Se quisermos um quadro completo do que o Novo Testamento
entende por missão e evangelismo, basta observarmos o relato do apóstolo Paulo
sobre a natureza de seu próprio ministério de evangelização (5).
III – Análise Histórica
3.1. A pessoa de Paulo
O divisor de águas na vida de Paulo foi o seu encontro com
Jesus no caminho de Damasco. A vida do apóstolo, portanto, pode ser dividia em
antes e depois de sua conversão.
a. Seu passado
Antes da sua conversão, Paulo era um judeu comprometido e
zeloso com suas tradições. O orgulho de Paulo com a sua herança judaica (Rm
3.1,2; 9.1-5; 2 Co 2.22; Gl 1.13,14 e Fp 3.4-6) o levou a perseguir a
comunidade cristã (Gl 1.13; Fp 3.6; 1 Co 15.8; v.t. At 8.1-3; 9.1-30).
Desde seu nascimento, por volta de 30 A.D., até seu
aparecimento em Jerusalém como perseguidor dos cristãos, há pouca informação
sobre a vida de Paulo. Sabe-se pelo testemunho dele mesmo que era da tribo de
Benjamim e zeloso membro do partido dos fariseus (Rm 11.1; Fp 3.5; At 23.6).
Era cidadão romano (At 16.37; 21.39; 22.25-28). Nasceu em Tarso, uma importante
cidade localizada na Cilícia, na costa oriental do Mediterrâneo, a norte de
Chipre e um notável centro de cultura e intelectualidade grega.
Estudiosos, como E. E. Ellis (In NDB, 1986, p. 1217), supõem
que Paulo se tornou familiarizado com diversas filosofias gregas e cultos
religiosos durante sua juventude em Tarso. Entretanto, Atos 22.3 parece indicar
que Paulo apenas nasceu em Tarso e foi educado em Jerusalém. Eu sou judeu,
nasci em tarso da Cilícia, mas criei-me nesta cidade e aqui fui instruído aos
pés de Gamaliel, segundo a exatidão da lei de nossos antepassados, sendo zeloso
para com Deus, assim como todos vós o sois no dia de hoje (grifo nosso).
Ainda jovem, Paulo recebeu autoridade oficial para dirigir
uma perseguição contra os cristãos, na qualidade de membro de uma sinagoga ou
concílio do sinédrio, conforme ele mesmo descreve em Atos 26.10 (e assim
procedi em Jerusalém. Havendo eu recebido autorização dos principais
sacerdotes, encerrei muitos dos santos nas prisões; e contra estes dava o meu
voto, quando os matavam) e Atos 26.12 (Com estes intuitos, parti para Damasco,
levando autorização dos principais sacerdotes e por eles comissionado).
À luz da educação e preeminência precoce de Paulo (cf. At
7.58; Gl 1.14), supomos que sua família desfrutava de alguma posição
político-social. O acesso do sobrinho de Paulo entre os líderes de Jerusalém
(At 23.16,20) parece favorecer essa suposição.
b. Sua conversão
Apesar de não existir evidências bíblicas de que Paulo
conheceu Jesus durante Seu ministério terreno, seus parentes crentes (cf. Rm
16.7) e sua experiência com o martírio de Estêvão (At 8.1) devem ter produzido
algum impacto sobre ele. A pergunta, e principalmente a afirmação de Cristo
ressurreto, conforme registrada em Atos 26.14, dá a entender isso. E, caindo
todos nós por terra, discursa Paulo perante o rei Agripa, ouvi uma voz que me
falava em língua hebraica: Saulo, Saulo, por que me persegues? Dura coisa é
recalcitrares contra os agrilhões.
O Dr. Timóteo Carriker nos faz uma breve mas não menos
importante observação quanto à conversão de Paulo. Diz ele:
A conversão de Paulo não era resultado de grandes
sentimentos de culpa pelo pecado, como tipificado na tradição luterana. Alguns
(como K. Stendahl) até preferem falar dum "chamamento" em vez de
conversão, e observam que Paulo mesmo prefere esse primeiro termo. Dizem que
Paulo não "mudou de religião", de judeu para cristão, mas que
permaneceu judeu, qualificando sua fé como a de um judeu cristão (Missão
Integral, 1992, p. 226).
Apesar desta observação, o próprio Carriker admite que ainda
prefere usar o termo "conversão" para descrever o encontro de Paulo
com Jesus, pois obviamente ele revisou radicalmente sua percepção sobre Jesus.
Embora ele não tenha abandonado todos os elementos do judaísmo, alguns pontos
fundamentais foram completamente reformulados. E ainda:
A sua experiência de conversão provocou uma revisão radical
no seu estilo de vida e na sua visão do mundo. Passou de principal perseguidor
a principal protagonista do movimento cristão primitivo; de "zeloso pelas
tradições dos nossos pais" a "apóstolo dos gentios" (Missão
Integral, 1992, p. 226).
Estou de pleno acordo com o autor.
Vale lembrar, ainda, que os três relatos da conversão de
Paulo (Atos 9, 22 e 26) são importantes não somente pelo significado da sua
conversão propriamente dita, mas também pela importância de se entender a
pessoa de Paulo acerca de sua união com Cristo e de seu ministério entre os
gentios.
c. Seu ministério
A partir do encontro com Jesus no caminho de Damasco, Paulo
passaria de perseguidor a perseguido; de causador de sofrimentos a sofredor.
O Senhor resumiria, ao relutante Ananias, o árduo ministério
de Paulo nesses termos: Vai, porque este é para mim um instrumento escolhido
para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem como perante os filhos de
Israel; pois eu lhe mostrarei quanto lhe importa sofrer pelo meu nome [At 9.15,
16] (grifo nosso).
À parte de um intervalo no deserto da Transjordânia, Paulo
passou os três primeiros anos de seu ministério pregando em Damasco (At 9.19;
Gl 1.17). Pressionado pelos judeus de Damasco, o apóstolo fugiu para Jerusalém,
onde Barnabé o apresentou aos irmãos duvidosos de sua conversão (At 9.26-28).
Seu ministério em Jerusalém dificilmente durou duas semanas, pois novamente os
judeus procuravam matá-lo (At 9.29). Para evitá-los, Paulo retornou à cidade de
seu nascimento (At 9.30), passando ali um "período de silêncio" de
cerca de dez anos.
Certamente este período é silencioso apenas para nós, pois
Barnabé, ouvindo falar de sua obra e relembrando seu primeiro encontro com o
apóstolo, solicitou a este que fosse para Antioquia da Síria ajudá-lo numa
florescente missão entre os gentios (At 11.19-26). De Antioquia, Paulo e
Barnabé foram enviados para socorrer os irmãos pobres da Judéia (At 11.29,30).
Os dois permaneceriam juntos até a primeira viagem missionária.
3.2. O mundo no tempo de Paulo
No tempo de Paulo três povos contribuíram significativamente
para a expansão do mundo de então, e em especial para a propagação do
evangelho, a saber: os romanos, os gregos e os judeus.
a. O domínio romano
Uma das grandes contribuições de Roma nos tempos bíblicos
foi a Pax Romana. As guerras entre as nações tornaram-se quase impossíveis sob
a égide daquele poderoso império. Esta paz entre as nações favoreceu
extraordinariamente a proclamação do evangelho entre os povos. Além disso, a
administração romana tornou fácil e segura as viagens e comunicação entre as
diferentes partes do mundo. Os piratas foram varridos dos mares e as
esplêndidas estradas romanas davam acesso a todas as partes do império. Essas
estradas notáveis realizaram naquela civilização o mesmo papel das nossas
estradas de rodagem e estradas de ferro da atualidade. E elas eram tão bem
vigiadas que os ladrões desistiam de seus assaltos. De modo que as viagens e o
intercâmbio comercial tiveram um amplo desenvolvimento. NICHOLS comenta:
É provável que durante os primeiros tempos do Cristianismo o
povo se locomovia de uma cidade para outra ou de um país para outro, muito mais
do que em qualquer outra época, exceto depois da Idade Média. Os que sabem como
as atuais facilidades de transporte têm auxiliado o trabalho missionário, podem
compreender o que significava esse estado de coisas para a implantação do
Cristianismo (História da Igreja Cristã, 1985, p. 7).
Seria praticamente impossível ao apóstolo Paulo, e a outros
de seu tempo, espalhar o evangelho mundo afora como o fizeram sem essa
liberdade e facilidade de trânsito possibilitadas pelo império romano.
b. A influência grega
Era típico do império romano não influenciar na cultura dos
povos conquistados, por isso, no início da era cristã os povos que habitavam as
regiões do Mediterrâneo já haviam sido profundamente influenciados pelo
espírito do povo grego. Colônias gregas, algumas das quais com centenas de
anos, foram amplamente disseminadas ao longo da costa do Mediterrâneo. Com seu
comércio os gregos foram em toda parte. A influência deles espalhou-se e foi
mais acentuada nas cidades e países onde se estabeleciam os mais importantes
centros do mundo de então. A influência dos gregos foi tão poderosa que o
período do domínio romano foi corretamente denominado de greco-romano. Quer
dizer, Roma governava politicamente mas a mentalidade dos povos desse império
tinha sido moldada fundamentalmente pelos gregos.
Contudo, uma das maiores contribuições gregas para o advento
do cristianismo foi a disseminação da língua em que o evangelho seria pregado
ao mundo pela primeira vez. Uma prova da extensão e da influência do grego está
no fato de que a língua mais falada nos países situados às margens do
Mediterrâneo era o dialeto grego conhecido por KOINÊ, o dialeto "comum".
Era esta a língua universal do mundo greco-romano, usada para todos os fins no
intercâmbio popular. Quem quer que a falasse seria entendido em toda parte,
especialmente nos grandes centros onde o cristianismo foi primeiramente
implantado. Os primeiros missionários, como por exemplo Paulo, fizeram quase
todas as suas pregações nesta língua e nela foram escritos os livros que vieram
a constituir o nosso Novo Testamento.
c. O povo judeu
Os judeus prepararam o "berço" do cristianismo,
por assim dizer. Primeiramente porque anteciparam a vida religiosa em que foram
instruídos o Senhor Jesus, os cristãos primitivos em geral e o apóstolo Paulo
em particular (At 23.6; 26.5). Além disso, a expectativa messiânica e a
preservação do Antigo Testamento pelos judeus foram fundamentais para a
confirmação do evangelho. Vale lembrar que muitos gentios eram prosélitos ou
simpatizantes do judaísmo, o que acabou se tornando um meio para se alcançar
estas pessoas. Era o costume de Paulo ir às sinagogas com o objetivo de evangelizar
esses gentios.
Talvez a maior contribuição que o cristianismo recebeu veio
por parte dos judeus da dispersão. Esses judeus, espalhados pelo mundo em
virtude dos cativeiros que sofreram, podiam ser encontrados em quase todas as
cidades daquela época. Em qualquer canto em que estivessem preservavam a
religião judaica e estabeleciam suas sinagogas. Em muitos lugares realizavam
trabalho missionário ativo. Assim, ganhavam entre os gentios numerosos
prosélitos, tornando conhecidos os ensinamentos judaicos.
A missão judaica foi uma precursora importante das missões
cristãs porque espalhou, extensivamente entre os gentios, elementos básicos
essenciais tanto ao judaísmo quanto ao cristianismo, como por exemplo a
remissão de pecados na pessoa do Messias. Muitos gentios, pelo contato com os
judeus, foram inspirados por essa expectação, ficando assim preparados para a
aceitação de Cristo como o Salvador que havia de vir.
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