APRENDENDO COM ABIMELEQUE
A fome (1:1)
Nos dias em que
julgavam os juizes, houve fome na terra; e um homem de Belém de Judá saiu a habitar na terra de Moabe, com
sua mulher e seus dois filhos.
Mudar de residência não é uma tarefa que a maioria das pessoas assume com leviandade. É uma coisa dispendiosa e inquietante. Implica arrancar raízes e deixar amigos e vizinhos.
Geralmente leva a procurar uma nova casa, estabelecer uma nova vizinhança, conhecer outras pessoas. Para uma família é um verdadeiro terremoto.
Embora Elimeleque, marido de Noemi, certamente não tivesse a mesma
quantidade de utensílios domésticos para transportar que um chefe de
família moderno, não foi uma decisão menos importante para ele. Ele resolveu sair de Belém por causa de uma fome.
Belém de Judá era uma cidade, cerca de oito quilómetros ao sul da atual Jerusalém. Seu nome significa "casa do pão", nome que aponta para a incomum fertilidade daquela região para o plantio de cereais (como o esclarece o capítulo 2 do livro de Rute), Também destaca que a fome era fora do comum.
Alguns comentaristas
crêem que a fome local na região de
Belém (aparentemente não havia tal dificuldade cerca
de oitenta quilómetros a sudeste, em Moabe, do outro lado do atual Mar Morto) devia-se em parte às pilhagens
associadas com o período caótico dos
juizes. A invasão midianita no período de Gideão, por exemplo, destruiu a lavoura e o
gado.
Por causa da fome,
Elimeleque decidiu que ele e sua família iriam morar
durante algum tempo como estrangeiros residentes (peregrinos) na
terra de Moabe.
Não temos certeza do que o induziu a partir. Embora a religião cananéia procurasse controlar o processo da natureza com os seus niveis da fertilidade, o povo de Javé fora ensinado a confiar nele conquanto à prosperidade da terra.
Será que a fome, na mente de Elimeleque, era um sinal do descontentamento divino? Não sabemos. Sabemos que outros belemitas permaneceram na terra à espera do final da fome e, ao que parece, passaram muito melhor do que lilimeleque (versículo 6).
À luz dos acontecimentos subsequentes, ficamos imaginando se o autor não pretende nos levar a pensar que Abimeleque não foi sábio na sua atitude!
Certamente a viagem não alcançou o seu objetivo: escapar da morte. Todos
os três homens da família morreram
Ali, com tantos lugares, por que ir a Moabe?!
Localizada no planalto, ao leste do Mar Morto, Moabe era povoada pt-Ios descendentes de Ló.6 Embora não tivessem sido atacados pêlos israelitas em seu retorno à terra prometida depois do êxodo, apesar de sua falta de amabilidade característica, os moabitas não deviam ser admitidos na congregação de Israel. Por quê?
Eles eram adoradores de Camos, um deus ao qual aparentemente se faziam sacrifícios humanos. Os moabitas eram, às vezes, chamados de "povo de Camos".
Além disso, durante o primeiro período dos juizes, Eglom, rei de Moabe, invadiu a terra dos israelitas e manteve o povo de Israel na escravidão durante dezoito anos.
Portanto, era um lugar muito estranho para um crente em Javé, habitante de Belém, escolher para morar. Por que não foram para algum lugar onde se adorava Javé? Será que era falta de confiança na providência de Deus?
Embora elogiando o pretenso desejo de Elimeleque de cuidar de sua família durante a fome, Matthew Henry pergunta como se poderia justificar a mudança a Moabe. "Aborrecer-nos com o lugar no qual Deus nos coloca e abandoná-lo na primeira oportunidade, logo que nos deparamos com algum desconforto ou alguma inconveniência, é evidência de um espírito descontente, desconfiado e instável."
Não temos dados suficientes para saber se a atitude de Elimeleque justifica o comentário de Matthew Henry. Porém, mesmo que a atitude de Elimeleque implique falta de fé ou expressão de descontentamento para com Javé, o restante do livro de Rute demonstra amplamente que a providência graciosa de Deus não é limitada pela loucura do homem.
A alegria final na família e o propósito de sua história, resultante da entrada de Rute no cenário, demonstram a rica benignidade da providência de Deus. Ver que tais benefícios foram colhidos como resultado de uma conduta impensada é uma evidência de seu amor. Felizmente, a providência de Deus cobre até os nossos erros!
Os nomes (1:2-5)
Este homem se chamava Elimeleque, e sua mulher,
Noemi; os filhos se chamavam Malom e
Quiliom, efrateus, de Belém de Judá; vieram à terra de Moabe e ficaram ali. 3 Morreu
Elimeleque, marido de Noemi; e ficou ela com seus dois filhos, 4os quais
casaram com mulheres moabitas; era o nome duma Órfã, e o nome da outra Rute; e ficaram ali quase
dez anos. 5 Morreram também
ambos, Malom e Quiliom, ficando assim a mulher desamparada de seus dois filhos e de seu marido.
Para o nosso autor, os nomes são significativos. Temos alguns personagens no livro cujos nomes não são mencionados, como o "resgatador" que aparece em Rute 4:1. Portanto devemos presumir que, se o escritor nos cita nomes, é com algum propósito especial.
Na maneira hebraica de pensar, saber o nome de uma pessoa é conhecer o seu caráter, conhecer a pessoa. O nome é a pessoa. Quando Abrão se tornou uma nova pessoa, ele recebeu um novo nome. Quando o nome de uma pessoa é destruído ou retirado, a pessoa, é extinguida da memória humana, como se nunca tivesse existido.
Era uma coisa terrível
ser deixado sem nome nem descendentes. Portanto, quando Deus diz o seu próprio nome, está falando do seu
caráter e compartilhando o seu
próprio ser com aqueles aos quais falou. "Javé" é o seu nome pessoal, o nome do Deus da aliança.
Elimeleque significa "meu Deus é
rei". Alguns comentaristas, como Henry,
que já citamos acima, imaginam que talvez haja alguma censura implícita no fato
de citar este nome. Não deveria tal nome expressar
dependência e confiança em Deus? Com certeza deveríamos lembrar que para
todo aquele que pode dizer "meu Deus é rei", embora não receba uma promessa de uma vida livre de problemas, há sempre
a promessa do pão de cada dia e a certeza de que não há necessidade de ficar morbidamente ansioso por causa do amanhã.15 Parte
do significado da fé pode ser expressa declarando que a f é é aquilo que Deus
nos dá para nos ajudar a enfrentar as incertezas da vida. Será que Elimeleque vivia de acordo com o seu nome?
Noemi
significa
"amável, encantadora, agradável". E o comovente significado deste nome
destaca-se mais tarde, quando Noemi volta de Moabe
com sua nora Rute, entristecida pelas experiências amargas que ela cria ter
recebido da mão do Senhor. "Não me chameis de
Noemi", ela diz aos seus
vizinhos, "chamai-me Mara; porque grande .unargura me tem dado o
Todo-poderoso" (1:20).
Malom e Quiliom, os filhos de
Noemi, aparentemente tinham antigos nomes cananeus, mas foram aqui mencionados
devido ao seu sig-n i ficado dentro do
cenário, para que entendamos as lágrimas e o sofrimento
do restante de Rute 1. "Malom" parece estar ligado a uma raiz
cujo significado é "estar enfermo"; e "Quiliom" significa
algo assim como "enfraquecer", ou "definhar", ou até mesmo "aniquilação".
Órfã e Rute são nomes moabitas e os seus significados não são muito claros. Mas o que está claro é a sua nacionalidade. Os filhos de lïlimeleque casaram-se com adoradoras de Camos e, embora tal casamento não fosse aparentemente proibido, os moabitas não eram admitidos na congregação para o culto.
A família, diz-nos o autor, era de efrateus. Efrata é uma palavra geralmente associada com Belém, mas o seu significado é muito incerto. As passagens onde aparece sugerem que há uma dignidade especial ou alguma importância em se estar ligado a um efrateu. Aqui, provavelmente, indica que estamos sendo apresentados a uma família bem estabelecida. Certamente, quando Noemi voltou, não era uma pessoa sem importância (1:19).
Talvez, como sugere Leon Morris, sua família pertencesse à "aristocracia" local, uma família que, quando partiu para Moabe, era conhecida como de pessoas ricas ("Ditosa eu parti", 1:21). Mas a riqueza e o prestígio não são garantias de felicidade material ou de ausência de sofrimento.
A fome angustiou a família o suficiente para que esta abandonasse o seu lar e partisse para
Moabe. Depois, além da perda do
conforto físico e da segurança do lar, veio a dor, não de uma morte, mas
de três. Noemi, em quem se concentra este
primeiro capítulo de Rute, ficou sozinha, sem lar, sem marido, sem filhos, sem
amigos, sem esperança, sem herança. O que o culto a Javé significava para ela
agora?
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